domingo, 27 de julho de 2008

A DESUMANIZAÇÃO DAS CIDADES - Benedito Ramos

O tempo passa, o homem evolui, mas não consegue aprender com seus próprios erros. Roma caiu, mas um dia foi a capital do mundo, o apogeu da civilização. Sua urbe era o que havia de mais exuberante, justamente por causa de suas construções majestosas, seus palácios, suas praças, fóruns, mercados, templos e tudo o mais que havia de brilho e riqueza. No entanto, reservava aos pobres os guetos, a falta de infra-estrutura e a miséria. Roma não produzia nada. Oferecia raríssimos empregos, quase sempre servis. Tudo vinha do campo. No entanto, o populacho mesmo estava nos buracos, nas vielas, nos subúrbios, em moradias precárias, sem água, esgoto ou banheiro, fazendo suas necessidades atrás das moitas. A política do “Pão e Circo” contemplava mais ricos do que pobres, afinal era nos espetáculos das arenas, sobretudo no Anfiteatro Flávio – o Coliseu, que recebiam sua porção de trigo. E na fila sempre tinha mais rico, que pobres, interessado no circo. Demagogia pura numa falsa política de assistencialismo.

Não é diferente no terceiro milênio, onde as cidades crescem, se verticalizam, os ricos se encastelam em apartamentos e condomínios de luxo, com um séquito de seguranças, câmeras de vigilância, carros blindados enquanto os bandidos os espreitam, procurando o momento certo para atacar. O homem do terceiro milênio vive apavorado, desconfiado de todo o ser vivente. Perdeu a liberdade de ir e vir na sua própria cidade, no seu próprio país.

O contrato social foi rasgado. Ao pobre, restam os entornos das cidades, os espaços esquecidos pela exploração imobiliária, os terrenos alagadiços, espremidos, insalubres e os morros que a erosão desmancha. Com um agravante: essa população circula em toda a cidade, mesmo com ruas fechadas e muros levantados. Lamentavelmente, a constituição que permite andar livremente onde se quer, mesmo sem carros blindados ou exército particular, não dá proteção contra bala perdida de assaltante ou policia.

A realidade é que desumanizamos as cidades. Criamos espaços para uma minoria que se protege e goza dos benefícios da modernidade. Nossas ruas estão lotadas de carros de passeio, enquanto a população agoniza num transporte urbano deficitário, inseguro e lento, em ruas poluídas.

Igual a Roma dos Césares, hoje ninguém parece perceber que é o crescimento desumano das cidades que contribui para o alargamento da exclusão social, da marginalidade e da violência. Roma construiu pontes, aquedutos e ostentou a cidade para a sua glória, humilhando a plebe. Será que somos diferentes?